Silvio de Azevedo Soares[1]
O pensador francês Michel Foucault (1926-1984) apresenta, no conjunto de sua obra, uma abordagem crítica original das relações de poder, dos discursos que veiculam saberes, dos modos de subjetivação (formas nas quais os sujeitos se compreendem e são apreendidos pela sociedade). Na construção de seu prisma analítico, Foucault constituiu uma síntese peculiar de diversos pensadores como Nietzsche, Canguilhem, Kant e Hyppolite (Eribon, 1990).[2] Abordagem tributária também das efervescências contestatórias de seu contexto, muitas nas quais se envolveu diretamente: o Maio de 68, as forças antipsiquiátricas, as lutas dos prisioneiros e os movimentos de liberação sexual (Fontana; Bertani, 1999, p. 344).
Estudiosos de Foucault – como Castro (2009, p. 264), Machado (2016, p. 32) e Negri (2016, p. 16) – comumente dividem, ainda que de maneira um tanto quanto arbitrária para fins introdutórios, a sua trajetória intelectual em três períodos: nos anos 1960, uma arqueologia dos saberes, das regras de enunciação e de circulação dos discursos; na década de 1970, uma analítica genealógica dos dispositivos de poder-saber que formam discursos e sujeitos; nos 1980, uma fase de problematização do sujeito e das práticas através das quais o ser humano se constituiu enquanto sujeito.
Todavia, tal periodização não é suficientemente precisa na articulação da heterogênea produção de Foucault, já que as questões do poder, do discurso e do sujeito estão entremeadas, ainda que com distintos enfoques e abordagens, nas suas inúmeras análises. O próprio Foucault (2016b, p. 354; 1995, p. 231) afirmou, em ocasiões distintas, que ora seu problema era a questão dos efeitos do poder e produção de verdades, ora essas diferentes fases estariam articuladas em torno do fio condutor do sujeito.[3] Além disso, tal cronologia acaba por obscurecer, devido à imagem de justaposição de fases sucessivas, as transições e os deslocamentos internos ao longo da produção foucaultiana (Revel, 2004, p. 67).
Nessa perspectiva, é possível delimitar, por exemplo, pelo menos dois momentos singulares na fase genealógica: a) um primeiro, que o início pode ser marcado por um texto de 1971, Nietzsche, a genealogia e a história, no qual Foucault (2016a) busca instrumentalizar um método de análise a partir da compreensão de Nietzsche a respeito do caráter agonístico das relações de poder; b) um segundo período – a partir dos cursos de 76 e 77, Em defesa da sociedade (1999) e Segurança, território, população (2008a) – no qual passa a analisar as relações de poder como também da ordem de governo das condutas.
Defert (2013, p. 55) e Machado (2017, p. 107) lembram também que Foucault almejava menos leitores e comentadores e mais utilizadores. Em entrevista de 1975, o próprio Foucault (2006c, p. 52) colocara a metáfora da “caixa de ferramentas” para ilustrar como concebia o emprego de suas obras e suas categorias analíticas:
Todos os meus livros, seja História da loucura seja outro, podem ser pequenas caixas de ferramentas. Se as pessoas querem mesmo abri-las, servirem-se de tal frase, tal ideia, tal análise como de uma chave de fenda, ou uma chave inglesa, para produzir um curto-circuito, desqualificar, quebrar os sistemas de poder, inclusive, eventualmente, os próprios sistemas de que meus livros resultaram… pois bem, tanto melhor!
Nesse sentido, trago algumas considerações sobre as ferramentas analíticas por ele desenvolvidas. Foucault (1985, p. 92; 2016a, p. 58) não foi um teórico do poder, não construiu uma teoria sistemática, totalizante e metafísica sobre o que é o poder. Em uma perspectiva não apriorística, não essencialista, não teleológica, Foucault descreve – em inúmeras análises histórico-sociais – como as estratégias, os procedimentos e os controles de poder se exerceram sobre a materialidade dos corpos humanos.
Nessas análises, Foucault (1995, p. 247) concebe o poder como relações múltiplas que “se enraízam no conjunto da rede social”, não constituindo uma substância que se possa ter, trocar ou retomar. Como relações capilares que atravessam toda espessura do campo social e que são imanentes a outros tipos de relações sociais (familiares, sexuais, econômicas etc.), os poderes funcionam a partir de redes de interações entre corpos, discursos, práticas, onde os sujeitos (enquanto intermediários, não somente objetos de poder) exercem, se submetem ou resistem ao poder. Assim, não se tratam de relações de poder que se impõem de maneira unívoca, mas de múltiplas lutas e enfrentamentos em um prisma agonístico, em dado contexto histórico-social, entre diferentes saberes, poderes e concepções de sujeito.
Na modernidade, o poder deve ser compreendido ainda não somente nas dimensões negativas de repressão, proibição e cerceamento, mas também como realidade positiva: constitui discursos e modos de individualização (Foucault, 1987, p. 172), produz instrumentos de observação, registro, investigação e acúmulo de saber (1999, p. 45).
No curso Segurança, território, população, em um deslocamento espiral no interior de seu quadro analítico,[4] Foucault (2008a) passa a considerar o poder também como da ordem do governo, como possibilidade de direção de condutas de outro indivíduo ou de um grupo: poder que incita, induz, desvia, facilita ou dificulta, limita ou estende, obriga ou impede certos comportamentos e condutas. Nesse sentido, afirma Foucault (1990, p. 14) que o termo poder “não faz outra coisa senão recobrir toda uma série de mecanismos particulares, definíveis e definidos, que parecem suscetíveis de induzir comportamentos ou discursos”.
Compete ainda assinalar que, para Foucault (1985, p. 111), o poder e o saber se implicam e se reforçam mutuamente em “um jogo complexo e instável”: às múltiplas relações de poder que perpassam a sociedade, se entrelaçam, a favor ou em oposição, específicos discursos de verdade. Na genealogia trata-se, então, de indagar também os discursos sobre seus efeitos de poder e de verdade sobre os corpos e os sujeitos.
Tais práticas de poder e discursos de saber, a partir de determinadas instituições (escola, hospício, prisão, etc.), engendram sujeitos, formas pelas quais os seres humanos se concebem e são compreendidos pelo corpo social (aluno, doente mental, delinquente, etc.). Isso em razão de, para Foucault, o sujeito não ser entendido como uma substância universal a priori. Pelo contrário, Foucault (2004b, p. 237) procura apresentar “um ceticismo sistemático a respeito de todos os universais antropológicos”. Em vista disso, propõe uma abordagem histórico-social da subjetividade: compreender os sujeitos a partir de determinadas relações históricas e sociais de discursos de saber e de relações de poder que constituem específicos modos de subjetivação (formas e práticas sociais de construção e percepção dos sujeitos).
É possível traçar duas dimensões de constituição dos sujeitos em Foucault. Em uma primeira definição, os modos de subjetivação aparecem como formas de objetivação dos sujeitos (ou de sujeição): disposições nas quais os sujeitos são tomados como objetos de uma determinada relação de conhecimento e de poder (Castro, 2009, p. 408). Nessa ótica, Vigiar e punir (Foucault, 1987) descreve como, na França do século XIX, a prisão e as práticas carcerárias, em articulação com o discurso da criminologia, constituem o sujeito como delinquente. Já História da sexualidade I: a vontade de saber (1985) delineia os discursos científicos e morais da Europa Ocidental do século XIX que, implicados em práticas correlatas, concebem o sujeito de sexualidade. Em um segundo sentido, presente, sobretudo, nos trabalhos dos anos 1980 denominados de leitura ética das práticas de si, modos de subjetivação se relacionam às maneiras pelas quais os seres humanos, com certo grau de autonomia se constituíram como sujeitos, não somente como objetos e produtos das redes de poder-saber (Gros, 2006, p. 637). Nessa acepção, o 2° e o 3° volumes de História da sexualidade (2014a, 2014b) analisam como, na Antiguidade, através de certas práticas se constituíram sujeitos morais de sexualidade. Do mesmo modo, o curso A hermenêutica do sujeito (2006a), examina as técnicas de si através das quais o sujeito subjetivava (escutava, interiorizava e praticava) uma verdade, ao invés de, em passiva obediência, se submeter a um discurso externo.
Se, como posto, as relações de poder não se impõem de forma onipotente e homogênea é porque o “traço distintivo do poder é que alguns homens podem mais ou menos determinar inteiramente a conduta de outros homens – mas nunca de maneira exaustiva ou coercitiva.” (Foucault, 2006b, p. 384). Ou seja, enquanto relações de poder capilarizadas e em rede, abrem-se espaços para possibilidades de recusas. Daí a reciprocidade ontológica entre estratégias de poder e táticas de resistência – as relações de poder “só podem existir em função de uma multiplicidade de pontos de resistência: estes desempenham nas relações de poder, o papel de adversário, de alvo, de apoio, de saliência onde se agarrar.” (1985, p. 91). Consequentemente, toda resistência é contraponto estratégico de forças, é resistência política.
O caráter múltiplo da resistência também é assinalado por Foucault: são insurreições dos sujeitos, no plural, prenhes de possibilidades de criação e transformação. Nas resistências às estratégias de poder-saber, Foucault (2004a, p. 80) ainda compreende a insurgência como um fato histórico por meio do qual “a subjetividade (não a dos grandes homens, mas a de qualquer um) se introduz na história e lhe dá seu alento”. Nesse sentido, Senellart (2008, p. 511) interpreta a noção de sujeito em Foucault não apenas como o indivíduo assujeitado, mas também como a “singularidade que se afirma na resistência ao poder”.
Em síntese, a analítica de Foucault implica em uma problematização das práticas e estratégias das relações de poder que influem nas ações possíveis dos corpos, engendram domínios e discursos de saber e que, articulados, participam nos processos de constituição dos sujeitos (que podem também resistir e se insurgir a essas disposições de poder-saber-sujeição).
Em termos metodológicos, essa problematização das relações de poder-saber-sujeição é operacionalizada nas pesquisas de cunho genealógico através da noção de dispositivo: “um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas” (Foucault, 2016c, p. 364). Por meio dessa ferramenta de método desenvolvida por Foucault pode-se recortar uma rede histórico-social de práticas polimorfas de poder, de saber e de constituição de sujeitos.
Nas análises genealógicas, Foucault (1985, p. 100; 2008b, p. 6) procura também adotar uma perspectiva nominalista no que se refere ao poder: realizar análises minuciosas das múltiplas relações sociais concretas sobre os corpos (enquanto interface primeira e imediata dos procedimentos de poder-saber) em diferentes domínios.[5] Nessas pesquisas, procurando destacar o que há de singular em dado contexto histórico (2016a, p. 55) e como são racionalizadas determinadas relações de poder (2006b, p. 385), Foucault traz uma análise ascendente dos procedimentos de poder, não com base em suas formas concentradas, centrais e gerais (como o Estado), mas partindo de suas extremidades capilares de exercício, em certas instituições, em práticas locais, em técnicas específicas.
Tal perspectiva ascendente de análise implica em examinar como micropoderes periféricos – com suas histórias, percursos, técnicas – foram deslocados, transformados e incorporados em formas mais gerais de poder.[6] Trata-se de um duplo condicionamento, de um encadeamento mútuo entre táticas locais e estratégias globais de poder: “Entre elas, nenhuma descontinuidade, como seria o caso de dois níveis diferentes (um microscópico e o outro macroscópico); mas, também, nenhuma homogeneidade (como se um nada mais fosse do que a projeção ampliada ou miniaturização do outro)” (Foucault, 1985, p. 110).
Munido dessa perspectiva analítico-metodológica, Foucault descreve uma reconfiguração na racionalidade global dos mecanismos de poder no contexto europeu de fins do século XVII e início do século XIX. Da preponderância de uma lógica de poder denominada soberania, que se exercia essencialmente no direito do soberano sobre os súditos de “causar a morte ou de deixar viver”,[7] houve a passagem para a prevalência do biopoder que, tomando como objeto o corpo e a vida do ser humano, caracteriza-se como “um poder de causar a vida ou devolver à morte” (Foucault, 1985, p. 148 e p. 150, grifos do autor).
Através das dimensões do biopoder – a disciplina, individualizante; a biopolítica, massificante –, a vida humana foi inserida em uma série de mecanismos de poder que possuem como objetivos a maximização das forças individuais e a otimização da vida coletiva. Na implementação das tecnologias disciplinares, Foucault (2010, p. 43) destaca a elaboração de uma série de normas – modelos considerados “ótimos” – que, como mecanismos de poder, possuíam a finalidade de coerção e correção dos indivíduos e grupos nos diferentes domínios em que elas se aplicavam. A partir das normas, o olhar normalizador do exame – constituindo saberes como a psiquiatria, a criminologia, a pedagogia – compôs um sistema exaustivo de classificação e hierarquização das diferenças individuais entre os “normais” e os “anormais”.
Já na biopolítica, a vida – em sua multiplicidade de circunstâncias sociais – foi reduzida à dimensão biológica de espécie humana e circunscrita à noção de população enquanto o conjunto plural de corpos vivos (Foucault, 1999, p. 289; 2008a, p. 28). Em sua interface biopolítica, o biopoder tomou, como objeto, os fenômenos biossociológicos da espécie humana como as doenças, a natalidade, a mortalidade. Tratava-se, assim, de buscar melhorar as condições de existência de uma população, procurando aumentar a vida, visando “intervir para fazer viver, e na maneira de viver, e no ‘como’ da vida” (1999, p. 295).
Como discursos de saber da biopolítica, constituiu-se a demografia, a estatística, a economia política e a medicina social. Discursos que se ocupavam do conjunto da população e seus fenômenos, que fundamentavam procedimentos de normalização – distintos da normalização disciplinar – que visavam coeficientes gerais normalmente esperados sobre a população e suas secções internas (como taxas de mortalidade e de morbidade de grupos e de ocupações que não colocassem em risco a vitalidade e a produtividade de uma população).
Todavia, sublinhe-se que esses estudos de Foucault se referem a uma sociedade de normalização e não a uma sociedade normalizada. Ou seja, normalização diz respeito ao modo de funcionamento e a finalidade do biopoder. Contudo, os procedimentos de normalização não se deram de forma absoluta, sem resistências, críticas e movimentos de luta. Existiram – e sucedem-se – fugas e restos às tentativas biopolíticas de totalização da massa de sujeitos à população. Ocorreram – e ainda se desenrolam – escapes às normas disciplinares e biopolíticas: a própria norma “traça a fronteira do que lhe é exterior (a diferença com respeito a todas as diferenças), a anormalidade” (Castro, 2009, p. 310).
Referências
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[1] Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Campus de Marília. Pesquisador do Observatório de Segurança Pública (OSP) e Coordenador Científico e Executivo do Grupo de Estudos em Saberes, Subjetividades, Poderes (GESP) da Unesp, Campus de Marília. E-mail: silvioaz@hotmail.com
[2] Originalidade que traz certa dificuldade em situar Foucault em um campo específico de conhecimento, a despeito das inúmeras contribuições teóricas e metodológicas às Ciências Humanas em geral. Sobre isso, Foucault (2006d, p. 79), ironicamente, se autointitulava não como historiador e nem como filósofo, mas como um “pirotécnico”, que fabrica alguma coisa que permita avançar, que possa fazer caírem os muros (acadêmicos, científicos, institucionais…): “Considero meus livros como minas, pacotes de explosivos… Espero que sejam!”.
[3] Com certo sarcasmo, Foucault (2008c, p. 20) já advertira na introdução de A arqueologia do saber de 1969: “Não me pergunte quem sou e não me diga para permanecer o mesmo: é uma moral de estado civil”.
[4] No curso anterior, Em defesa da sociedade, Foucault (1999) já fizera uma autocrítica ao modelo binário da guerra (constituído a partir de Nietzsche) enquanto princípio de análise das relações de poder (utilizado nos estudos anteriores do período que denominei como seu primeiro momento genealógico). Tal modelo da guerra entre dois antagonistas seria insuficiente para compreender a multiplicidade das relações de poder, pois as codifica, de forma excessiva, como violência, enfrentamento, rivalidade (Pelbart, 2017, p. 14).
[5] Enquanto materiais de análise que sustentam empiricamente essa abordagem, Foucault constrói um corpus documental que engloba variadas fontes: novelas literárias, taxonomias naturalistas, manuais médicos e psiquiátricos, códigos jurídicos, processos judiciais, textos filosóficos e religiosos, planos arquitetônicos, decretos administrativos, entre outros documentos (Freire, 2018, p. 281).
[6] Nesse sentido, por exemplo, Vigiar e punir (Foucault, 1987) descreve como as práticas de poder e instrumentos de saber que emergem com a projeção da prisão enquanto modalidade de pena se generalizam para outros domínios (oficinas, fábricas, escolas, etc.), constituindo um sistema disciplinar.
[7] A morte é, assim, objeto do poder, produção política direta do soberano, resultado do poder de punir na forma pública do suplício. Destinada aos criminosos que atentavam contra a autoridade e a vida do soberano, a morte por suplício era um espetáculo em praça pública, exposto aos súditos como elemento de coação. No início de Vigiar e punir, Foucault (1987) descreve o suplício imposto a Robert-François Damiens em 1757, acusado de atentar contra a vida do Rei Luís XV: torturado, esquartejado, queimado e reduzido às cinzas.